MUNDOS PARALELOS
Cai a noite na cidade, saio pela brisa carente de sol, através dos antigos edifícios, iluminados pelos candeeiros, que furam o denso nevoeiro, como se a luz cortasse as trevas que o ambiente nocturno criara.
O mendigo que dorme, num pequeno banco de jardim, agarrado ao único lençol que tem, para se proteger da baixa temperatura, passa-me despercebido e nem a poça de água gelada que me molha os pés, me causa qualquer arrepio. A brisa forte e fria que me tenta furar a gola da camisola, arrefece-me a face e aos poucos dificulta-me o pensamento, que já não era grande coisa...As folhas caídas no chão, secas e molhadas, qual paradoxo que me atravessa a alma...essas folhas que já outrora foram verdes, que já anteriormente dançaram fortes e lindas, lá no alto, banhadas pela mais calmante luz solar, elas que também foram despojadas, pelo aparecimento do frio, esse frio que incomoda, esse frio que destrói, esse frio que arrefece....esse frio que mata.
Os estranhos que comigo se cruzam, agarrados aos seus casacos, defendendo-se deste frio terrível, mostram que a experiência já se cruzara com eles também, mostram que já perderam, que já caíram, e mostram um interessante respeito pelas folhas que se atravessam nos seus caminhos. Passo também por carros banais, iluminados por fora, escuros por dentro, qual velocidade eles circulam, como se fugissem da noite escura e fria, para se abrigarem e aquecerem o coração.
Os meus olhos, a minha pele, o meu nariz, filtram tantas emoções, emoções tão parecidas e tão diferentes, mas que não me causam qualquer sensação, que não a dissimulada solidão, dor e carência, que trago comigo ao longo do caminho que furo pelo meio da escuridão, da neblina, do vento, da água da chuva...do frio.
Penso em tantas coisas passadas, penso em tantas coisas presentes, e em tantas outras futuras...penso e não penso em nada, porque o que me vai na alma é nada, e só com esse nada posso ver tudo, esse tudo que me persegue e me arrefece, que me mutila, e me corrói...
Dentro de algum tempo, sei que o sol irromperá, por detrás das cinzentas nuvens frias e acalmará esta frieza, trará novas folhas verdes, um calmo e sereno caminho quente para acalmar o coração, ar puro e novos pensamentos, pois na primavera o cenário velho dá lugar ao novo...
Será que um dia, a minha folha vai ter espaço para crescer, para apanhar sol, vento para dançar e água para a abençoar?
Se o conseguir, ela vai caír...
(Nunixtreme)
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